sábado, 1 de maio de 2010

ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS

O casal parecia perfeito, era Tim Burton e um conto totalmente psicodélico envolvendo loucura e personagens caricatos. O tom sombrio que o diretor costuma usar em seus filmes poderia ser a cereja no topo do grande bolo que a película poderia se tornar. Infelizmente, o confeiteiro usou glacê demais e esqueceu completamente do recheio, deixando o mesmo sem gosto e fazendo com que a sobremesa perca seu encanto.
Grande parte da população conhece a pequena menina Alice da adaptação animada de 1951. Lá uma criança, em uma bela tarde, avista um coelho branco - usando um terno - e decide segui-lo. Ao entrar pelo mesmo buraco que o animal, Alice vai parar em mundo incrivelmente alternativo ao nosso.
O que muitos não sabem é que o desenho de Walt Disney nada mais é do que uma versão infantil de um conto literário de Lewis Carroll. A história do livro não tem o mesmo clima pomposo de suas transições cinematográficas; a lógica do mesmo é usar a fábula para mostrar um mundo dos sonhos na cabeça de uma menina que dá claros sinais de esquizofrenia. Cada personagem carrega um enorme significado, do perturbador Gato de Cheshire - que faz alusões e reflexões filosóficas a cada diálogo - ao Chapeleiro Louco , afinal a expressão "louco como um chapeleiro" não surgiu simplesmente por acaso.
Mas chega o ano de 2010 e, com ele, uma nova versão da história aparece em cartazes no mundo todo. Dessa vez temos uma continuação da aventura vivida por Alice quando a mesma tinha 6 anos. O dia passado na País das Maravilhas é tido como um sonho para a menina, que já tem 19 anos e está prestes a ser pedida em casamento. Mas, no meio da festa, o coelho branco dá as caras novamente, levando a moça para o que um dia foi um lugar maluco, porém alegre. Mas, no lugar disso, é encontrado um mundo sombrio e devastado pelo reinado da Rainha de Copas (Helena Bonham Carter).
O motivo de sua volta é explicado assim que Alice reencontra os tradicionais habitantes daquele universo. A menina é a única que pode derrubar a atual Rainha de seu trono e devolver o governo para a dócil Rainha Branca (Anne Hathaway), mas para isso deve matar o monstro de nome Jabberwocky - mostrando que Tim Burton se baseou tanto em "Alice no País das Maravilhas" como em "Alice Através do Espelho e o que Ela Encontrou por lá", pois Jabberwocky só aparecia nessa continuação do livro original.
Talvez o principal erro do diretor tenha sido a escolha de produzir uma continuação, e não adaptar a obra principal. Presumindo que todos já conhecem seus personagens, Burton apenas os joga na tela e deixa tudo fluir naturalmente, o que não causa uma boa impressão; pois nem mesmo a reação de Alice (Mia Wasikowska) ao ver cada um é de surpresa - considerando que sua aventura anterior não passou de um mero sonho, um susto da personagem até que seria bem vindo.
É como se o filme seguisse uma linha reta e já programada para um final esperado desde os 10 minutos iniciais. Não há uma reviravolta nem nada do tipo, não existe um momento que faça com que a película "perca a sua máscara", é aquilo e somente aquilo até o final. A má direção mostra-se evidente quando incríveis criaturas perdem o brilho na tela, é o caso da Lagarta, que, está extremamente fiel visualmente, mas peca em sua função, sendo apenas um coadjuvante nulo ao decorrer da fita.
O toque visual de Tim Burton é mais do que explícito, todos os maravilhosos e detalhados ambientes do País das Maravilhas estão estampados em alta resolução nas telas. Mas a pouca exploração dos mesmos por parte da protagonista acaba por diminuir seu glamour, transformando o ótimo trabalho da equipe de fotografia e efeitos-especiais em um plano de fundo no decorrer dos 100 minutos de projeção.
A atuação da desconhecida Mia Wasikowska é de mediana para fraca. A atriz passa as mesmas emoções de um androide, fazendo com que sua personagem decorra o filme todo desligada do mundo. Muitos criticam Keanu Reeves (Velocidade Máxima, Matrix) pela falta de expressão que o ator demonstra em seus projetos; parece que Tim Burton acaba de lançar uma versão feminina - e piorada - do eterno Neo.
Jhonny Depp (trilogia Piratas do Caribe, Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet) encarna um ótimo Chapeleiro Louco. A insanidade do personagem é transportada com devida fidelidade para o cinema, há ainda um excelente toque de drama - devido à situação atual da vida do personagem - inserido pelo ator.
Nos tempos atuais, ninguém melhor que Depp para colocar este tipo de figura em uma produção live-action. Mas há sempre um porém, até quando o anti-hollywoodiano intérprete irá se esconder atrás de atuações caricatas que usam maquiagem em excesso para esconder seu rosto? O Chapeleiro é incontestável dentro do universo proposto pelo longa, mas também é o pirata Jack Sparrow, o Willy Wonka da nova versão de "A Fantástica Fábrica de Chocolate" e muitos outros papéis encarnados pelo ator. São sempre as mesmas expressões faciais, o mesmo caminhar e o mesmo gesto afeminado com os braços. Talvez já tenha passado da hora de Depp investir em escolhas mais sérias, como o criminoso John Dillinger do ótimo "Inimigos Públicos", onde o ator realmente mostra a sua capacidade em interpretar um ser humano "normal".
A pobre Anne Hathaway (O Diário da Princesa, Agente 86)
está irreconhecível como Rainha Branca. Sua atuação é inexplicável ao ponto de seus movimentos parecerem mais artificiais do que uma peça dramática da pior categoria. A atriz parece se perder em suas falas durante um diálogo mais elaborado; ou, usando outras palavras para resumir sua performance, parece que há sempre alguém segurando o roteiro atrás das câmeras e Hathaway só tem o trabalho de ler.
A trilha sonora de Danny Elfman, velho companheiro de Burton, cumpre seu papel; sempre usando seus tons mais fortes seguidos por uma pequena faixa mais afinada, contracenando perfeitamente com os momentos de ação ou drama. Pena que não passa de mais um ponto cego no meio de tantas atrocidades cometidas a uma excelente obra.
Ao final da sessão, "Alice no País das Maravilhas" deixa uma péssima impressão ao cinema mundial. Pois, pior do que acompanhar um filme desconhecido que sai do nada e chega a lugar nenhum, é assistir a uma grande oportunidade sendo jogada ladeira abaixo por causa dos caprichos de um diretor que insiste em fazer de todos os seus projetos uma produção gótica e psicodélica, mas esquece de trabalhar melhor em seu conteúdo, fazendo de tudo uma grande massa de chatice e melodrama que deixariam até mesmo a Lebre de Março com sono.

Nota: 5

4 comentários:

Lorenna Barros disse...

BRILHANTE! auoehiauheoiuha :D

Stanley disse...

Talvez Burton não tenha usado a quantidade de cogulemos azuis que Lewis Carroll, usou para escrever os livros... XD

A Critica ta massa, gostosa de ler... Parabens!

Anônimo disse...

HADOUKEN!

Paulinha** disse...

Voltouu!!
Que bom!!

é ainda não vi o filme, e até desanimei agora...rss